sexta-feira, dezembro 07, 2007

O canal que nunca pára

Crítica do livro Globo News: 10 anos, 24 horas no ar / coordenação e texto final: Vera Íris Paternostro. – São Paulo: Editora Globo, 2006.










O livro Globo News, 10 anos, 24 horas no ar, comemora, como o próprio título mostra, uma década da existência do primeiro canal de Jornalismo do Brasil. A coordenadora de texto, Vera Íris Paternostro, é bastante conhecida no meio televisivo. Desde o início de sua carreira ela trabalha com televisão e tem algumas obras sobre o tema, como O texto TV – Manual de Telejornalismo, lançado em 1999. Em sua mais nova publicação, a atual gerente de desenvolvimento de jornalistas da TV Globo conta a história por trás dos bastidores de um dos canais a cabo mais conhecidos do país.

Nestes dez anos, inúmeros acontecimentos marcantes. Desde que foi lançada, em 1996, a Globo News fez coberturas que dificilmente ocorreriam em canais abertos, justamente pela proposta do canal, de jornalismo 24 horas ininterruptas.

As dificuldades na criação do conceito do canal, a seleção da equipe e os preparativos pouco antes de ir ao ar pela primeira vez. Além disso, os problemas corriqueiros de uma programação que nunca pára são alguns dos pontos abordados no livro de quase 450 páginas.

Segundo a autora do livro, o início foi extremamente trabalhoso. Para selecionar a equipe do canal, foi preciso observar todos os telejornais das emissoras concorrentes, para escolher os melhores profissionais. Mas a aposta em novatos também foi alta. Grande parte dos que trabalhavam na Globo News inicialmente eram recém formados e até mesmo estagiários. E o livro conta como essa combinação deu certo, ao aliar os news, como eram chamados os focas, e os olds, jornalistas mais experientes. Tanto é que, atualmente, vários daqueles que iniciaram suas carreiras no canal a cabo hoje são repórteres e apresentadores renomados da Rede Globo, como Renata Vasconcelos, Maria Beltrão e Marcio Gomes.

O livro conta os principais fatos desta década, tais como a morte da princesa Diana, a visita ao Brasil e morte do papa João Paulo II, a posse do novo papa, as Copas do Mundo, as Olimpíadas, os ataques terroristas de 11 de setembro, as guerras no Afeganistão e Iraque, a queda de Saddam Hussein e as principais crises políticas brasileiras como o mensalão.

O interessante é como o livro aborda a narração dos fatos, muitas vezes com bastante detalhes, sendo uma verdadeira aula de história contemporânea, com os bastidores da cobertura jornalística feita pelo canal. Há vários relatos de toda a equipe, sejam eles apresentadores, repórteres, editores ou técnicos.

As dificuldades em manter um canal 24 horas no ar são mostradas ao relatar as limitações iniciais devido à reduzida equipe. Era grande o número de reprises de programas da Rede Globo e de produções próprias do canal. Com o passar do tempo, a programação evoluiu e se estabilizou.

Cada programa que fez e ainda faz parte do canal é dissecado, desde sua estréia, mostrando fatos que marcaram cada um deles, seja com histórias de seus apresentadores ou com a participação de diferentes personalidades.

Dividido em 24 capítulos para simbolizar as 24 horas no ar, há assuntos variados. Improviso e concentração; A lição do aprendizado; Política on-line, Passado, presente e tendências; e um outro capítulo todo dedicado ao principal jornal da casa, o Jornal das Dez, envolvem o leitor de forma com que ele entenda todo o processo do canal.

Um dos pontos fortes do livro é a maneira como é ressaltado, o tempo todo, o trabalho em equipe. A importância da convivência em grupo e a ajuda dispensada um ao outro na busca por um produto de qualidade é inspirador. Diversos momentos assim são exemplificados. Na cobertura dos reféns no ônibus 174, no Rio de Janeiro em 2000, produtores e repórteres estavam na rua, cada um apurando com uma fonte diferente. Enquanto o repórter entrava ao vivo por telefone, o produtor repassava as informações que acabara de apurar do outro lado do ouvido. O resultado: um trabalho em grupo bastante elogiado e, conseqüentemente, uma boa cobertura.

A necessidade de confiança entre o apresentador e o editor responsável, que repassa informações a todo momento pelo ponto eletrônico, é lembrada em outros períodos do texto. É comum o apresentador estar prestes a encerrar o telejornal quando o editor repassa pelo aparelho as últimas notícias. É preciso concentração para conseguir falar e ouvir ao mesmo tempo ao vivo na TV.

Há um capítulo inteiro, e também algumas inserções durante todo o livro, mostrando como é o trabalho dos repórteres, produtores e editores em Brasília. Lidar com política não é nada fácil. Notícia boa é aquela que está por trás dos bastidores, daí a necessidade de se relacionar bem com políticos e assessores do governo. O trabalho dos comentaristas também é ressaltado por se tratar, basicamente, de cultivar bons relacionamentos para conseguir boas fontes e informações.
Falando em comentários, a quantidade de comentaristas é um grande diferencial do canal.

Na busca por aprofundar os temas tratados nas reportagens, especialistas das mais diferentes áreas são sempre convidados para participar ao vivo dos jornais e coberturas especiais. Economia, política, história e vários outros temas contam sempre com a avaliação de alguém que entende bem do assunto. A finalidade é propiciar dinamismo e uma análise crítica que diferencia o jornalismo da Globo News do que é feito nos canais abertos de televisão.

Contar a história do canal a cabo por meio dos principais acontecimentos é outro ponto forte da obra. Realmente seria complicado não associar uma coisa à outra, já que, se é um canal de Jornalismo, sua história está intrinsecamente ligada aos fatos reais. Nas Olimpíadas em que a Globo News esteve presente, na Austrália e depois na Grécia, por exemplo, tudo de inusitado é contado. As aventuras das equipes que foram fazer as coberturas, as séries e reportagens especiais e o entrosamento entre jornalistas. Fatos narrados de forma irreverente, permitindo uma espécie de elo entre leitor e aqueles profissionais.

A dedicação, o amor pelo trabalho e a busca do furo são outros pontos que chamam a atenção na equipe da Globo News. Jornalismo é uma profissão que exige uma atualizações constantes. O cansaço e o estresse fazem parte da rotina de quem trabalha em redações, imagine em um canal que nunca sai do ar. Casos relativos à dedicação de seus profissionais são exemplificados, como quando a princesa Diana morreu e a repórter Maria Beltrão interrompeu a lua de mel para fazer a cobertura do acontecimento. Já a apresentadora Renata Vasconcellos, que estava de licença-maternidade na época dos atentados de 11 de setembro, fez questão de entrar em contato com um conhecido que morava próximo ao World Trade Center para que, logo depois, ele entrasse ao vivo por telefone.

O livro comemorativo da Globo News cumpre o que promete ao dissecar de maneira bastante exemplificada e com inúmeros relatos o sucesso do canal ao longo desses dez anos. É possível afirmar que a transparência com que as dificuldades são relatadas e a forma como todos vibram com o trabalho bem sucedido, entre outros detalhes, servem não apenas para explicar como é o funcionamento de uma redação, mas para contar como é a vida de um jornalista. Os profissionais falam de suas inseguranças, compartilham suas experiências mais marcantes e deixam-se entregar pela emoção da profissão. É uma boa aula de jornalismo televisivo e, conseqüentemente, de história contemporânea.