domingo, fevereiro 05, 2006

Fábrica de talentos

Concebida como proposta inovadora, Escola de Música de Brasília chega aos 36 anos como referência nacional no ensino dessa arte
Aerton Guimarães

A Escola de Música de Brasília surgiu em 1974 com uma proposta inovadora: possibilitar uma educação profissional por meio do desenvolvimento de competências e habilidades musicais de jovens e adultos sem perder o caráter social de cidadania e mundo de trabalho.

Mas não é qualquer um que consegue entrar na EMB. Como as vagas são limitadas, há um sorteio por semestre, o qual é muito concorrido, pois as aulas são gratuitas e bem conceituadas no mundo musical. Ao ingressar na escola, o aluno passa por diversas áreas, como coral e aulas teóricas, até pegar o instrumento que quer, de fato, aprender.

Antes da criação da Escola de Música, o ensino público de música em Brasília ocorria principalmente em duas instituições: no Centro de Ensino Médio Elefante Branco, na Asa Sul, e no Centro de Ensino Médio Asa Branca, em Taguatinga.

Após quase 10 anos lutando para conseguir um espaço próprio, os professores de música da cidade finalmente conseguiram, em 1974, a sede definitiva da instituição na quadra 602 da L2 Sul. O ensino era limitado a aulas de violino, flauta doce, trompa e tuba.

No entanto, em 1985 a escola ganhou novas disciplinas, com a implantação do Núcleo de Música Popular e do Núcleo de Percussão, com aulas de violão, bateria e arranjos, por exemplo. Nessa época ocorreu a estruturação da Musicografia Braille e também da Musicalização Infantil. Antes disso as aulas eram direcionadas apenas aos adultos.

Com a aquisição de vários instrumentos e captação de recursos do GDF, governo federal e de parcerias com empresas privadas, a instituição cresceu e hoje conta com salas de teatro e várias salas de aula nas quais são ministradas disciplinas teóricas e práticas, além de grandes projetos, como o renomado Curso Internacional de Verão.

Curso de Verão: sons e ritmos para todos os gostos

Todos os anos a Escola de Música de Brasília se destaca por sua programação do Curso Internacional de Verão. Este ano, em sua 28º edição, não foi diferente. O que se viu foram aulas dinâmicas, revelação de talentos e ótimas apresentações.

Promovido com recursos da Secretaria de Estado de Educação do governo do Distrito Federal, a primeira edição do curso, realizada em 1976, teve a participação de oito professores e pouco mais de 80 alunos.

Ao longo dos anos o evento se tornou cada vez mais renomado no mundo da música, atraindo participantes não apenas do DF, mas também de todo o Brasil e de outros países.
A 28º edição do curso, iniciado no dia 11 de janeiro, terminou no último sábado (28) e contou com a participação de 770 alunos e 69 professores. Totalizando 112 espetáculos, foi considerada um sucesso tanto pelos alunos que participaram como pelo público, que pôde apreciar apresentações diárias de todos os tipos: corais, concertos de violão, orquestras sinfônicas a até uma ópera. Segundo a assessoria da EMB, mais de 60 mil pessoas assistiram aos eventos.

Falando em ópera, essa foi a primeira vez que ocorreu esse tipo de apresentação em um Curso de Verão. O espetáculo Cavalleria Rusticana, apresentado na Sala Villa Lobos do Teatro Nacional, conta uma história de amor e traição representada por mais de 80 vozes e 80 instrumentistas, os quais foram selecionados durante o Curso de Verão.

Mas nem só de apresentações vive o curso. Várias palestras, seminários, debates e workshops fazem parte da programação, a qual atende os mais variados gostos.
E foi assim que a Escola de Música de Brasília se tornou referência na América Latina, oferecendo aulas de qualidade com professores exigentes. Um dos objetivos da EMB é desmistificar a pretensa distância que alguns acreditam existir entre a música erudita e a popular.

De acordo com o maestro Carlos Galvão, participar do curso é uma chance muito boa para experimentar diferentes ramos artísticos e pedagógicos, pois ele visa a promover a análise, discussão e realização do fenômeno sonoro sem restrições de gênero e/ou estilo, na busca da mais abrangente compreensão do pensar e do fazer musicais.

Profissionais de três continentes vieram ao evento

Os participantes do Curso de Verão não são apenas estudantes. Educadores, regentes, compositores, intérpretes, musicólogos e etnomusicólogos também fazem parte do evento, reconhecido por sua importância na formação musical não só de quem está no palco, mas também do público.

O diretor da Escola, Maestro Carlos Galvão, avaliou muito bem o evento devido à oportunidade de interação entre alunos, professores e público. “O nível musical dos alunos eleva a qualidade geral do curso. Todos ganham com isso. Os alunos aperfeiçoam suas habilidades e crescem musicalmente, os professores desenvolvem melhor o trabalho e o público ganha concertos com qualidade internacional”, afirma Galvão.

Uma curiosidade: dos 69 professores participantes do evento, que durou 18 dias, 16 são estrangeiros advindos da América Latina, Europa e Estados Unidos. Assim, foi possível trocar experiências multiculturais nas 50 disciplinas oferecidas.

Instituição cria aulas para os alunos especiais

A Escola de Música também é um exemplo no quesito responsabilidade social. Há 19 anos existem disciplinas para alunos com necessidades educacionais especiais. A que mais se destaca é a disciplina Musicografia Braille. Seu objetivo é capacitar músicos para que se tornem aptos a ensinar outros alunos especiais, portadores de deficiência visual.

Assim, o esperado é que a partir da habilitação de professores nessa área a demanda seja suprida e haja diminuição no número de rejeição de estudantes com deficiência visual nas faculdades. De acordo com Carlos Galvão, diretor da Escola, "muitos músicos brasileiros portadores de deficiências visuais são professores pela persistência e pelo amor à sala de aula, pois poucas são as possibilidades que esses profissionais têm para se especializar".A disciplina, também ofertada durante o Curso de Verão, foi considerada um sucesso. A professora Isabel Bertevelli veio de São Paulo especialmente para lecionar a matéria e foi bem recebida.

Jornal Planalto Central - 1º a 7 de fevereiro de 2006